Samuel teme que a Irmandade Muçulmana assuma o poder
Um guia turístico cristão que trabalha no Egito se mostrou preocupado com as transformações políticas que o país possa sofrer com a queda de Hosni Mubarak, após 30 anos de ditadura. Em entrevista ao site da Veja, aos 41 anos, Aid Gabala Samuel, que é formado em arqueologia, teme que a Irmandade Muçulmana assuma o poder e transforme a sua vida em caos.Dois cadeados separam Samuel das ruas do Cairo. Em seu apartamento, com a segurança da porta reforçada, protege-se das manifestações que ocorrem ao seu redor. Do lado de dentro, respira-se a preocupação com o futuro do país.
O nome bíblico Samuel deixa evidente que ele é um dos 12 milhões de cristãos do Egito que não serão tolerados caso o grupo de radicais islâmicos chegue aos cargos mais altos do país. “Se isso acontecer, terei que sair”, disse, por telefone, ao site de VEJA.
Samuel frisa que apoia os protestos contra Hosni Mubarak, e que também quer um novo governo - desde que não seja comandado pelos “irmãos islâmicos”, como os chama. Ele sabe que, dentre os diferentes movimentos presentes na Praça Tahrir, a Irmandade é a mais bem organizada e com maior número de seguidores. E teme os desdobramentos prováveis disso tudo.
“Eles não pedem o governo para eles agora. São espertos. No momento, atendem aos pedidos dos jovens manifestantes de combater à corrupção do governo atual. O medo dos cristãos é de que, quando mudar o sistema vigente, eles (a Irmandade Muçulmana) mostrem a segunda cara”, explica.
Para Samuel, o ideal seria a formação de um conselho com a presença de diversos movimentos da sociedade de onde sairia uma nova constituição, laica. “Longe da religião”, imagina o arqueólogo. Atualmente, apesar de haver liberdade de culto, são muitos os obstáculos à prática cristã. Construir uma igreja no Egito, por exemplo, é uma cruzada. “O Cairo cresceu, e novas cidades surgiram. Elas querem ter igrejas, mas é complicado. Tem que ter assinatura de oficiais do alto da hierarquia. Agora, não é uma liberdade completa, mas podemos orar, pelo menos. Com os islamitas, ficará impossível”, lamenta desde já.
Para piorar a insegurança de Samuel em relação ao futuro, pesa o fato de ser guia turístico e arqueólogo. “Para a Irmandade Muçulmana, as ruínas são símbolo do paganismo. É um pensamento radical. Não acredito que destruiriam as pirâmides, mas aqui temos muitos museus ao ar livre. Isso me preocupa.” Neste momento, a história do país está guardada por homens do Exército. Samuel continua em casa, sem trabalho. O último grupo de turistas que atendeu se despediu às pressas no dia 29 de janeiro. Eram brasileiros aflitos para deixar o Egito. “E eu tentava acalmá-los. Dizia que isso sempre acontecia. Guia sempre finge que está tudo tranquilo”, diz.
Neste momento, todo o esforço de Samuel é para acalmar a si mesmo. Sua sensação é de que a cada dia a situação piora, mas ele tenta se convencer de que vai melhorar. A polícia voltou às ruas, ele já tem coragem de sair um pouco – sempre de dia.
Portas abertas/ Veja
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